O final de ano se aproxima com uma sucessão de sustos para intranquilizar o dia a dia do brasileiro. A quantidade de atos violentos – especialmente por parte da Polícia Militar de São Paulo – que parecem banalizar a dor, a desumanidade e o desrespeito aos direitos mais comezinhos competem, em tempo real, com imagens de guerra na Síria, na Ucrânia, na Faixa de Gaza e com atos de corrupção explícita dentro do Congresso e do Judiciário.
A impressão que fica é a de que estamos perto da borda de um precipício e que seremos tragados para um buraco sem fundo. Por onde andamos e para onde olhamos, vem uma sensação angustiante de estarmos presos em um círculo invisível de giz e que um muro estranho nos impede de ver adiante, enquanto uma mão perversa no pescoço nos tira o ar e o fôlego.
No último domingo, 8 de dezembro, a 2 dias da comemoração mundial dos Direitos Humanos, na Favela do Bugre no Dique do Sambaiatuba em São Vicente, um grupo de policiais militares matou um jovem de 24 anos na frente da mãe. Consta que os representantes da segurança pública do governador Tarcísio entraram no local gritando “Derrite, Derrite”, que vem a ser o nome do secretário de Segurança Pública de São Paulo. É mais uma demonstração óbvia de que a política de incentivar a violência promovida, ostensivamente, pelo governo estaduallevou a um descontrole perigoso.
Por isso mesmo, é necessário ressaltar a importância da decisão do ministro Barroso, Presidente do Supremo Tribunal que, atendendo a um pedido da Defensoria Pública, determinou que a polícia usasse câmeras durante todas as operações policiais, as quais devem gravar toda a atuação e que não possam ser manipuladas pelos próprios agentes.
Há uma tentativa disseminada na sociedade de fazer crer que essas decisões, particularmente as da Suprema Corte, são exageradas e que representaria um ativismo judicial. Ou seja, a mesma sociedade que incentiva e louva a violência cruel e covarde- especialmente contra negros e pobres, os invisíveis sociais – por parte de agentes de segurança critica decisões que procuram, minimamente, colocar freios na barbárie.
Decisões respaldadas na Constituição e que atendem sempre a processos movidos por quem tem legitimidade ativa para agir. O Judiciário, repito sempre, é um Poder inerte e só age se provocado. Mas tem a obrigação e a responsabilidade de agir quando instado.
A violência policial já assumiu ares de guerra civil. É necessário responsabilizar quem fomenta e quem patrocina a barbárie. Não apenas o policial que executa as ordens, mesmo que muitas delas sejam ministradas de maneira subliminar e indireta. E é necessário olhar de frente e dizer claramente que esse é o modus operandi de uma extrema direita sempre prestes a atacar. É uma doença que se espalhou como um câncer na sociedade. Os sinais estão por toda parte. Não é só na segurança pública. Basta querer ver.
O país está em um perigoso estado de metástase. É sempre bom invocarmos José Saramago: “Temos a obrigação de não permitir que nos ceguem, pois se nos cegarem, comportar-nos-emos ainda mais do que agora como membros de um rebanho, um rebanho que avança para o suicídio”.
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay