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Colégio particular pede que alunos participem de mostra sobre africanidade utilizando ‘trajes típicos’ de pessoas negras


Para especialista em letramento racial, comunicado enviado a responsáveis por crianças pode gerar situações de apropriação cultural e ‘blackface’. Colégio Marista São Luís fica no bairro das Graças, na Zona Norte do Recife
Google Street View/Reprodução
Uma escola particular do Recife pediu que alunos utilizassem “trajes típicos” de pessoas negras durante uma mostra de conhecimento sobre africanidade. A recomendação enviada aos pais das crianças sugere a utilização de roupas com estampas étnicas, além de turbantes e tranças nagô por meninas, e pinturas corporais com tinta branca por meninos.
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O pedido foi feito através de um comunicado aos responsáveis pelos alunos do 4º ano do ensino fundamental do Colégio Marista São Luís, localizado no bairro das Graças, na Zona Norte do Recife. Segundo o texto, os alunos devem ir caracterizados para a feira de conhecimento que está marcada para o dia 7 de dezembro.
Para Dayse Rodrigues, pedagoga especialista em diversidade, inclusão e letramento racial ouvida pelo g1, a iniciativa da mostra é positiva, mas a forma como o comunicado foi elaborado e enviado aos pais e responsáveis pode gerar situações de apropriação cultural e “blackface” – que é quando uma pessoa não negra pinta sua pele para se “fantasiar” de pessoa preta.
“Quando eu olho para o comunicado, penso em em várias coisas: na apropriação cultural, no reforço de estereótipos. Também [penso] que isso pode ocasionar ‘blackface’, porque muitos pais não têm esse conhecimento. Quando a gente lê, parece que eles vão se fantasiar de pessoas negras”, explicou Dayse Rodrigues.
Sugestão de ‘trajes femininos’ enviada aos pais de alunos do Colégio Marista
Reprodução/WhatsApp
Segundo a especialista, o pedido para que as crianças se vistam com “trajes típicos”, embora possa parecer uma homenagem, reforça a ideia de que há um padrão de negritude caricato.
“É problemático porque é como se fosse um folclore. Desumaniza, reforça estereótipos. Você reproduz uma caricatura que não representa todas as pessoas negras. As mães e pais podem cair nisso sem nem perceber qualquer sentido negativo. Pode estar achando que está fazendo uma coisa incrível, mas na realidade ela está reproduzindo ‘blackface’ e a escola não bota nenhuma observação quanto a isso”, completou a pedagoga.
Meninos foram orientados a utilizarem pinturas corporais com tinta branca
Reprodução/WhatsApp
Também ouvida pelo g1, a diretora do Instituto Enegrecer, Manoela Alves, concorda com Dayse Rodrigues sobre a importância e o impacto positivo de uma feira sobre africanidade, mas sugere que a apresentação da cultura negra para as crianças pode ser feito através do empoderamento de pessoas pretas.
“As crianças podem aprender a partir da vivência com pessoas negras, com pessoas de religião de matriz africana, com pessoas que já usam esses trajes e adereços característicos da população negra no seu dia a dia. A gente não precisa que pessoas brancas usem para que a gente possa tomar parte. Quando a gente traz pessoas negras, você tem lugar de fala, de dor, de vivência”, pontuou Manoela.
‘Blackface’: entenda o que é e por que é considerado ato racista
Segundo a presidente da Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Pernambuco, Débora Gonçalves, a Lei 10.639 de 2003 tornou obrigatório o ensino da história e das culturas afro-brasileira e africana em todas as escolas brasileiras. O objetivo da lei é a valorização da herança negra, mas, para a advogada, por vezes o texto é mal interpretado.
“A gente vive num racismo estrutural que às vezes, infelizmente, as instituições de ensino e outras instituições não sabem interpretar o que essa Lei quer dizer. […] O mais adequado seria que a escola trouxesse os elementos para esses alunos, mostrasse a cultura, mostrasse o significado de cada traje, de cada roupa que empodera a população negra, do que incentivar que se usasse uma fantasia de negro”, disse Débora Gonçalves.
Procurado pelo g1, o Colégio Marista São Luís disse que tem “a inclusão e a acolhida como valores irrevogáveis” e que não teve “a intenção de orientar estudantes, educadores ou famílias a realizarem qualquer ação que possa ser considerada racista”.
“Reconhecemos que o comunicado enviado às famílias não transmitiu de forma assertiva o objetivo e amplitude do projeto. Pedimos nossas sinceras desculpas a todos que potencialmente ficaram ofendidos pelo texto. Garantimos que sempre atuaremos em prol de uma educação antirracista, com práticas pedagógicas que abordam a diversidade e o respeito às diferenças”, disse o Colégio Marista em nota.
Comunicado do Colégio Marista São Luís no Recife sugere como alunos do 4º ano do ensino fundamental devem se vestir para feira sobre africanidade
Reprodução/WhatsApp
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