Há indícios de várias irregularidades no licenciamento do empreendimento Quinta da Villa Residence, situado na área da antiga Escola da Floresta. Aérea de área desmatada em Alter do Chão (PA)
Leonardo Milano
O Ministério Público Federal (MPF) recomendou esta semana à Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) de Santarém (PA), no oeste do Pará, a suspensão imediata das licenças e autorizações ambientais concedidas para a construção do condomínio de luxo Quinta da Villa Residence, na Área de Proteção Ambiental (APA) de Alter do Chão.
A recomendação do MPF, expedida em caráter de urgência, se baseia em indícios de irregularidades administrativas, fundiárias, ambientais, arqueológicas e relacionadas à possíveis violações de direitos dos povos indígenas e comunidades do local.
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A obra, que já havia sido embargada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), está situada em um terreno onde funcionava a Escola da Floresta, um espaço de educação ambiental com valorização da diversidade biológica e do conhecimento tradicional de povos indígenas e comunidades extrativistas.
O local também é considerado sagrado pelo povo indígena Borari, que alega não ter sido consultado sobre o empreendimento, ferindo o direito à consulta livre, prévia e informada assegurado pela Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Durante inspeção realizada no local no último dia 15, o MPF constatou o desmatamento de floresta nativa sem autorização, destruição de área de preservação permanente e risco de poluição de cursos d’água da região, destaca o procurador da República Vítor Vieira Alves.
A vistoria também apontou evidências de que o solo e subsolo abrigam, total ou parcialmente, sítio arqueológico, tendo sido identificada a presença de terra preta, que geralmente caracteriza manejo da terra por populações que viviam na região há milênios. Em uma área próxima foi encontrado um sítio arqueológico, denominado Makukawa, pelo projeto de extensão “Arqueologia na Escola: Histórias da Amazônia”, da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa).
Além disso, há evidências de que o terreno, cuja posse anterior era do Conselho Nacional de Populações Extrativistas (CNS), seja terra pública, e não propriedade privada, como alegado pelos empreendedores. A análise fundiária indica que o imóvel é de domínio da União (Gleba Federal Mojuí dos Campos), registrada na Secretaria do Patrimônio da União (SPU), e estaria sob gestão do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Possível conflito de interesses
A investigação do MPF aponta, ainda, para um possível conflito de interesses envolvendo a empresa construtora, Machado Lima Empreendimentos, e autoridades da Prefeitura de Santarém. O sócio da empresa é irmão do secretário municipal de governo, que, por sua vez, é parente do atual prefeito. O empresário também é advogado, já atuou como procurador-geral do Município e participa das reuniões de transição da nova gestão. Seu escritório de advocacia já teve, como sócia-administradora, a atual procuradora-geral do Município, e funciona no mesmo imóvel da sede da construtora.
A suspensão das licenças e autorizações deve vigorar, pelo menos, até a conclusão de inquérito civil do MPF sobre o tema, indicou o procurador da República Vítor Vieira Alves. A Semma deve enviar ao MPF documentos que comprovem as medidas adotadas para o cumprimento da recomendação. A omissão no fornecimento de respostas pode resultar em ações judiciais contra os agentes públicos responsáveis.
Pacote de medidas
A recomendação faz parte de um conjunto de medidas do MPF para proteger o meio ambiente e o povo indígena Borari em Alter do Chão.
A suspensão das licenças visa garantir a proteção do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos direitos dos povos indígenas, enquanto as investigações sobre as irregularidades apontadas seguem em curso.
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