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Como Grécia e Espanha superaram crise econômica e agora puxam crescimento da União Europeia


A crise e o desemprego atingiram o sul da Europa durante muitos anos, mas agora a Espanha e a Grécia estão entre as economias que mais crescem no continente. Manifestantes gregos protestando por um novo acordo sobre a dívida pública durante a crise de 2015.
Getty Images via BBC
A Espanha e a Grécia foram, por muitos anos, sinônimos de crise, desemprego, emigração e decadência.
Agora, estes dois países se tornaram os motores do crescimento na zona do euro.
A expectativa é de que a Espanha cresça 2,9% neste ano, mais do que qualquer outra economia avançada — e mais de três vezes a média dos países da zona do euro, enquanto a economia grega deve registrar um crescimento de cerca de 2,3%, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Ao mesmo tempo, a Alemanha e a França, as duas maiores economias da União Europeia (UE), estão disputando o infame título de “homem doente da Europa”, termo usado para rotular as nações que atravessam dificuldades econômicas.
A economia alemã deve contrair 0,2% neste ano, enquanto a França, que está crescendo muito pouco, vai encerrar 2024 com um grande déficit em suas contas públicas, equivalente a 6% do Produto interno bruto (PIB), o que fez soar o alarme.
A preocupação é tanta que, no dia 2 de dezembro, os custos da dívida da França ultrapassaram os da Grécia pela primeira vez na história.
“A economia grega está em muito boa forma. Está havendo uma recuperação após uma longa crise. Há um grande número de investimentos importantes e também um aumento na receita deixada pelos turistas”, explica Vassilis Monastiriotis, professor de economia política do Instituto Europeu de Economia da Universidade London School of Economics (LSE), no Reino Unido.
Mas ele acredita que o crescimento poderia ser melhor.
“O que está acontecendo no resto da Europa, especialmente na Alemanha e na França, está prejudicando o crescimento da Grécia”, acrescenta o economista grego.
Ruben Dewitte, economista do grupo de análise econômica e financeira ING, com sede em Bruxelas, afirma que, desde o fim da crise da pandemia de covid-19, a Espanha é um dos países que mais contribuiu para o crescimento econômico da zona do euro.
“Nesse sentido, pode-se dizer que ambas as nações do sul da Europa se tornaram motores do crescimento do bloco”, disse ele à BBC News Mundo, serviço de notícias em espanhol da BBC.
Os espanhóis organizaram uma greve geral, em 2012, para protestar contra uma série de reformas trabalhistas destinadas a ajudar a Espanha a reduzir seu déficit.
Getty Images via BBC
Recorde após recorde após longa crise
A Espanha e a Grécia estavam entre os países mais afetados pela Grande Recessão que atingiu a economia mundial em 2008.
Na Espanha, eclodiu uma grande crise econômica que foi acentuada pela explosão de uma bolha imobiliária, enquanto na Grécia a crise se intensificou em 2010, quando o país revelou um déficit muito alto, foi excluído dos mercados de títulos e forçado a pedir empréstimos de emergência à União Europeia e ao FMI.
Ambos os eventos fizeram parte da crise do euro que ameaçou acabar com a zona do euro.
Os dois países conseguiram superar suas crises graças a generosos resgates internacionais e programas de austeridade rigorosos. Eles também introduziram mudanças legislativas para atrair investimentos e gerar crescimento econômico.
Mas quando as feridas deixadas pela crise estavam cicatrizando, veio a pandemia de 2020.
A Espanha entrou novamente em recessão naquele ano. Sua enorme dependência do turismo fez com que sua economia contraísse 11% em 2020, a maior queda em 85 anos, e a maior dentro do bloco europeu.
O fim da pandemia desencadeou um “boom” no setor de turismo, que deu um grande impulso às economias dos países do sul da Europa.
“Quando a Espanha reabriu no fim da pandemia, houve um fenômeno de ‘gasto de vingança’ por parte dos consumidores, após o longo período de confinamento”, explica o economista Ruben Dewitte.
“As pessoas estavam ansiosas para sair, tirar férias e gastar dinheiro, e a economia espanhola se beneficiou disso.”
Desde então, a Espanha continua batendo recorde em termos de receita de turismo e chegada de visitantes.
Em agosto, o número de turistas internacionais que visitaram o país ficou perto de 11 milhões, cerca de 7,3% a mais do que no mesmo mês do ano anterior, e superior ao número registrado em julho.
A expectativa é de que o país ultrapasse 65 milhões de chegadas internacionais neste ano, outro recorde.
A Grécia vivenciou uma recuperação semelhante.
De acordo com um relatório da Insete, ONG fundada por iniciativa da Confederação Grega de Turismo, as chegadas internacionais já estão acima dos níveis pré-pandemia.
Entre janeiro e agosto de 2024, o país recebeu mais de 27,7 milhões de visitantes, um aumento de quase 10% em relação ao mesmo período de 2023.
Aumento da confiança e dos investimentos
As economias de Espanha, Grécia e outros países do sul da Europa também têm se beneficiado de um enorme pacote de ajuda de 750 bilhões de euros aprovado pela União Europeia em 2020 para impulsionar a recuperação econômica do bloco após a pandemia.
No caso da Grécia, a confiança do mercado financeiro voltou, assim como os investimentos, observa Monastiriotis, da LSE.
“Desde o fim da crise da dívida soberana, tem havido muita ênfase em políticas para aumentar a renda da população, como o aumento do salário mínimo em 2019”, explica.
De acordo com ele, isso deu um grande impulso à economia grega e à demanda interna.
“Além disso, com a mudança de governo em 2019, houve um aumento da confiança dos investidores, por isso que os investimentos no país aumentaram”, acrescentou.
Várias empresas multinacionais, como a Microsoft e a Pfizer, realizaram investimentos milionários na Grécia nos últimos anos.
“Mas o principal impulso à economia foi dado pelo turismo”, afirma Monastiriotis.
No ano passado, 33 milhões de pessoas visitaram o país, um número recorde, segundo o Banco da Grécia.
De acordo com a mesma fonte, o número de visitantes aumentou 15,5% no primeiro semestre de 2024. Espera-se que ultrapasse 35 milhões neste ano.
Em resposta à crescente demanda, várias companhias aéreas anunciaram planos para aumentar o número de assentos e voos disponíveis para a Grécia.
Um grande número de empresas também está investindo para aumentar e satisfazer a demanda hoteleira dos viajantes.
Mas enquanto os políticos e o setor de turismo comemoram estes investimentos, muitos gregos reclamam que o excesso de turistas está sobrecarregando os serviços públicos, gerando escassez de água e fazendo com que os preços das moradias disparem.
Katerina Kikilia, chefe do departamento de Gestão de Turismo da Universidade de Western Attica, em Atenas, acredita que já existe um problema de “turismo excessivo” na Grécia, especialmente nos meses de verão.
“Além da capital, há também o problema nas famosas ilhas gregas de Mykonos e Santorini, que já tinham esse problema em 2019 ou até mesmo antes, e agora se tornou intolerável para os moradores locais”, disse ela à BBC em setembro deste ano.
O excesso de turismo também está se fazendo sentir na Espanha. No verão passado, houve protestos em cidades como Barcelona, Málaga e Palma de Mallorca, contra o grande fluxo de visitantes.
Os manifestantes reclamavam que os turistas não só atravancam os espaços públicos, como também aumentam os preços das moradias, já que cada vez mais apartamentos são usados para aluguel de temporada, em detrimento dos moradores locais.
Imigração e gastos públicos
Além das contribuições do setor de turismo e dos gastos do governo, que aumentaram muito desde a crise da pandemia de covid-19, outro fator que impulsionou o crescimento econômico espanhol foi o aumento da produtividade por hora, facilitado, em parte, por um aumento acentuado da imigração.
A Espanha recebeu um total líquido de 727.005 imigrantes em 2022, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE).
As exportações de serviços profissionais também dispararam.
“Passaram de representar cerca de 6% do PIB para (representar) 7,5%. Observamos um forte aumento na demanda proveniente da América Latina e dos Estados Unidos, de modo que se pode intuir que está ligado aos serviços que estão sendo oferecidos em espanhol”, explica Miguel Cardoso, economista do BBVA Research.
Cardoso diz que é difícil que todos se beneficiem igualmente da recuperação econômica — e que, desta vez, os migrantes estão entre os que mais contribuíram e os que mais se beneficiaram.
De acordo com uma análise realizada pela Fedea e pelo BBVA Research, 90% dos trabalhadores que ingressaram no mercado de trabalho espanhol nos últimos três anos são imigrantes.
O problema da inflação
Cardoso ressalta que parte da população espanhola sente que, apesar da boa situação da economia, perdeu poder aquisitivo devido ao aumento da inflação.
“Eles sentem que têm o mesmo emprego que tinham há cinco anos, que seu salário não cresceu de acordo com a inflação, e que pagam cada vez mais impostos”, explica.
“Aqui na Espanha, todo mundo vai te dizer a mesma coisa: a cesta básica custa o dobro ou mais do que custava há alguns anos, enquanto os salários quase não subiram”, afirmou à BBC News Mundo Samuel Rico, gerente do TSR Group, uma empresa de transporte e envio de mercadorias com sede em Madri e Corunha.
“Eu viajo muito e sinto que a Espanha está ficando cada vez mais cara. Os preços aqui já são tão altos quanto os da França, e sinto que, quando vou à Alemanha, é quase mais barato ir a um supermercado lá, mas a diferença é que os salários alemães e franceses são melhores do que os espanhóis”, acrescenta.
“E é ainda pior para os empresários. Pagamos cada vez mais impostos, o que também não se traduz em melhoria dos serviços públicos. Mas é cada vez mais caro contratar alguém”.
De acordo com os economistas, no atual contexto inflacionário, os benefícios da recuperação vão levar algum tempo para chegar à maior parte da população.
E isso vai acontecer desde que o crescimento continue de forma sustentada, alertam.
Crescimento sustentável?
Para os economistas, permanece a dúvida se o crescimento da Espanha e da Grécia será sustentável ao longo do tempo.
Ruben Dewitte prevê que o crescimento do PIB espanhol sofra uma desaceleração.
“Se olharmos para os fatores que contribuíram para o forte crescimento da Espanha, o turismo, os gastos públicos e a imigração, são fatores que simplesmente não podem continuar a crescer indefinidamente no longo prazo”, ressalta o economista.
Mas ele acredita que há dois fatores que poderiam ajudar: o consumo e o investimento privado.
Monastiriotis acredita, por sua vez, que os fundamentos da Grécia são bons: “A dívida está diminuindo, portanto, a expectativa é de que o crescimento permaneça acima da média europeia nos próximos anos.”
Mas ele admite que a economia grega tem um grande problema estrutural, e outro problema de produtividade.
“O país depende da exportação de alguns produtos, como o petróleo, assim como do setor de turismo.”
É por isso que ele acredita que o crescimento atual não é sustentável a longo prazo.
“A economia grega, a longo prazo, tem o grande desafio de passar por uma transição rumo à diversificação, criando mais indústrias, mais manufatura e também uma produção mais ecológica.”
Outro desafio é o desemprego em ambos os países.
Embora tenha sido reduzido drasticamente desde a crise, ainda está em torno de 11% na Espanha, e 9% na Grécia, quase o dobro da média da União Europeia.
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