Ofensas raciais eram feitas por supervisor, segundo a 1ª Vara do Trabalho de Canoas. Cabe recurso da sentença. Sede da Justiça do Trabalho, em Canoas, onde processo foi julgado
TRT4/Divulgação
Uma decisão da Justiça do Trabalho determinou que uma empresa de engenharia, localizada em Porto Alegre, pague R$ 15 mil a um funcionário que foi chamado de “negão gordo” pelo supervisor. A reparação das ofensas foi fixada em R$ 9,7 mil. O restante do recurso é o direito do trabalhador a salário-substituição e diferenças de verbas rescisórias.
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A decisão do juiz Lucas Pasquali Vieira, da 1ª Vara do Trabalho de Canoas, foi publicada em 24 de outubro. Tanto o funcionário quanto a empresa ainda podem recorrer da decisão.
A empresa condenada é a Eixo M Engenharia, do grupo Melnick. Em nota ao g1, a empresa respondeu que “a Melnick repudia veementemente qualquer ato de discriminação e reitera o seu compromisso pelo respeito, empatia e responsabilidade social no ambiente de trabalho. Em relação à referida ação, esclarece que não comenta questões judiciais em curso e reitera que já está tomando as medidas judiciais cabíveis”.
Já o advogado da vítima afirmou que a justiça reparou parcialmente o que ainda não foi superado nas relações de trabalho e na sociedade, que é o preconceito.
A vítima das ofensas raciais era um instalador hidráulico, que apresentou testemunhos comprovando as ofensas que caracterizavam assédio moral vertical, ou seja, praticado por um superior hierárquico no trabalho. O funcionário não teria usado o canal de denúncias da empresa por medo de sofrer retaliações.
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Segundo o juiz, o trabalhador estava duplamente vulnerável na condição dos preconceitos, já que era chamado de “negão” e “gordo”. O magistrado também ressaltou que a empresa praticava o racismo recreativo, que consiste em ofender em tom de brincadeira.
“As pessoas negras, ao longo da história, sofreram e ainda sofrem muitos estereótipos negativos, com rotulações que buscam inferiorizá-las, de forma direta ou indireta. É preciso, portanto, estar atento a todas as possibilidades de discriminação que podem ocorrer no ambiente de trabalho, afastando-se a ideia de naturalização ou de banalização do racismo”, argumentou o juiz.
De acordo com o juiz, a empresa violou a obrigação de oferecer um ambiente de trabalho livre de ameaças de discriminação, violando a dignidade do funcionário.
Medo de retaliações impedem denúncias
Vítimas de todo o tipo de ofensa podem procurar o setor de recursos humanos da empresa, assim como Ministério Público do Trabalho. No entanto, muitos dos trabalhadores têm medo das consequências, segundo Jorge Terra, procurador-geral do Estado e doutor em Direito.
“O fato é que as pessoas ficam com medo de perder o emprego. E aí então, quando estão por ser dispensadas ou foram dispensadas, elas comunicam”, afirma. “A não ser em uma situação limite, quando a pessoa não tem mais condições de se apresentar, se está adoecendo”, complementa.
Para o especialista, no mundo do trabalho o racismo também se manifesta de forma velada, quando, por questão de raça, uma pessoa deixa de ser contratada, não é promovida ou é demitida.
“Na medida em que a pessoa fica sujeita à discriminação, isso pode fazer com que ela não tenha emprego, pode fazer com que ela não tenha um bom desempenho na escola, no mercado de trabalho. Isso vai gerar uma desigualdade”, reforça Terra.
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