Inflação maior e despesas mais altas com juros (resultado da alta na Selic) forçam dívida pública para cima. Tendências reforçam preocupação de investidores com a economia. O crescimento dos gastos públicos nos últimos anos, com um limite permanente de cerca de R$ 170 bilhões anuais a mais nas despesas, tem pressionado a inflação – obrigando o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central a subir mais os juros.
E tanto o crescimento da inflação quanto a alta nas despesas com juros (resultado do aumento da taxa Selic, para conter os preços) forçam para cima a dívida pública, aumentando ainda mais a preocupação por parte de investidores — que passam a pedir juros ainda maiores para comprar títulos públicos do Tesouro Nacional.
De acordo com economistas, essa dinâmica ruim tem colocado a economia brasileira em um tipo de “ciclo vicioso”, no qual notícias, indicadores e eventuais declarações de autoridades retroalimentam a percepção dos investidores sobre um cenário negativo na economia.
“Quando os gastos estão maiores, o governo transfere maior poder de compra para a população. Você mantém a economia aquecida. O segundo ponto é a questão da credibilidade do país. Quando começa a parecer que a dívida está numa trajetória é insustentável, crescendo rápido e sem perspectiva de estabilizar, os investidores ficam mais temerosos”, avaliou o economista Guilherme Tinoco, pesquisador associado do FGV IBRE.
Prévia da inflação rompe teto da meta em 2024
Os indicadores da economia são interligados – e a mudança em um gera impacto em todos os outros. Entenda abaixo um exemplo de como pode funcionar esse “ciclo vicioso”:
▶️Um cenário de mais gastos na economia, sem compensação, aumenta o temor dos investidores sobre a manutenção das regras para as contas públicas (arcabouço fiscal) e sobre a sustentabilidade da dívida no médio e longo prazos.
▶️Esse temor pressiona a taxa de câmbio: os investidores retém aplicações em dólar, ou os enviam para mercados considerados “mais seguros” e, com isso, há desvalorização do real (alta da moeda norte-americana).
▶️A combinação de mais gastos públicos, e uma taxa de câmbio mais alta, por sua vez, pressiona a inflação: os produtos importados ficam mais caros em real – incluindo matérias-primas e equipamentos usados no agro e na indústria nacional.
▶️Para tentar domar a inflação, o Banco Central também tem de subir os juros: eles são um instrumento para convencer as pessoas a investir (poupar) mais e gastar menos, o que “esfria” a economia e ajuda a controlar os preços.
▶️Inflação e juros mais altos, no entanto, significam um custo maior quem emitiu o título e precisa remunerar o investidor – o governo, no caso dos títulos públicos. Por isso, retroalimentam um aumento da dívida pública.
▶️Com câmbio, inflação, juros e dívida pública subindo, o cenário econômico se torna instável. O que, obviamente, aumenta ainda mais o temor dos investidores, que pedem juros maiores para comprar títulos públicos.
Peso da inflação na dívida pública
Hoje, quase 30% da dívida em títulos públicos está atrelada a índices de preços, como o IPCA, que mede a inflação do país.
Segundo um cálculo do BC, isso significa que uma alta de 1 ponto nesses índices eleva a dívida pública em cerca de R$ 18 bilhões por ano – 0,15 ponto percentual do PIB.
Alta da Selic e dívida pública
A alta da taxa Selic também impacta diretamente a dívida, já que metade do estoque de títulos públicos é atrelada à taxa básica de juros – hoje em 12,25% ao ano (uma das maiores do mundo em termos reais).
Uma elevação de 1 ponto na taxa Selic aumenta a dívida bruta em R$ 50 bilhões por ano, ou 0,43 ponto percentual do PIB, diz o BC.
Recados do Banco Central
Na última ata do Copom, quando a taxa básica de juros subiu para 12,25% ao ano, em dezembro, o Banco Central, com quatro economistas do Partido dos Trabalhadores na diretoria, avaliou que a conjunção de um “mercado de trabalho robusto, política fiscal expansionista [alta de gastos e vigor nas concessões de crédito amplo segue indicando um suporte ao consumo e consequentemente à demanda agregada”.
O BC voltou a citar a “necessidade de políticas fiscal e monetária [para os juros] “harmoniosas”, ou seja, de promover um equilíbrio nas contas públicas, proporcionando uma perspectiva de estabilização da dívida pública no futuro, evitando a necessidade de uma puxada maior nos juros nos próximos anos.
Para Guilherme Tinoco, economista do FGV IBRE, o governo tem de mostrar ao mercado que as contas públicas vão ser sustentáveis nos próximos anos, apresentando um “pacote crível” com “ajuste estrutural da despesa”, isto é, mudança em regras existentes que pressionam os gastos para cima.
“Tomando medidas mais ou menos em linha com aquele pacote que foi anunciado em novembro e aprovado no Congresso, mas talvez com alguma medida adicional para mostrar o mercado que as metas [fiscais] vão ser cumpridas”, acrescentou ele.
O governo busca zerar o rombo das contas públicas em 2025, mas admite que elas ficarão no vermelho até o fim do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva mesmo com novos aumentos de impostos.
Na ata do Copom, o Banco Central observou, ainda, que a percepção do mercado financeiro sobre o pacote fiscal, considerado aquém do necessário, afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco (curva de juros), as expectativas de inflação e a taxa de câmbio.
Especialista fala sobre o que esperar da economia brasileira para 2025
Pacote de corte de gastos
O pacote proposto pelo governo, e aprovado pelo Legislativo, prevê alterações no ritmo de crescimento do salário mínimo, que será menor, nos gastos com educação, do abono salarial, e de benefícios sociais, entre outros.
De acordo com números do Ministério da Fazenda, o pacote de cortes de gastos deve gerar uma economia de R$ 69,8 bilhões em 2025 e 2026, após as mudanças implementadas pelo Congresso Nacional. Para o mercado financeiro, entretanto, o impacto do pacote será bem menor.
No fim do ano passado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, minimizou as mudanças feitas pelo Legislativo e também acenou ao mercado falando em novas medidas de redução de despesas no decorrer de 2025, sem detalhá-las.
Dívida alta
A dívida do setor público consolidado fechou o mês de novembro em 77,7% do PIB – o equivalente a R$ 9,1 trilhões, segundo informações do Banco Central.
A dívida já subiu seis pontos percentuais desde o começo do governo Lula, em 2023, pois somava 71,7% do PIB no fechamento de 2022.
Se for considerado o critério do Fundo Monetário Internacional (FMI), que contabiliza os títulos públicos que estão na carteira do BC e que é utilizada na comparação internacional, a dívida brasileira terminou novembro desse ano em um patamar maior ainda: em 90,3% do PIB.
Neste nível, a dívida brasileira está abaixo de nações desenvolvidas, próxima de países da União Europeia e acima dos emergentes, da América Latina e do Caribe.
A relação entre dívida e PIB é um indicador relevante para o mercado, interpretado como um sinal da capacidade do país de honrar seus compromissos financeiros de curto, médio e longo prazo. Quanto maior a dívida em relação ao PIB, maior o risco de um calote em momentos de crise.
Além do patamar da dívida, a performance das contas públicas também é avaliada por investidores.
No ano passado, em meio a ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para baixar a taxa de juros da economia, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, explicou no Congresso Nacional como a dívida pública influencia a taxa de juros brasileira.
“Na parte dos juros, a gente não pode confundir causa e efeito. A dívida não é alta porque o juro é alto. É o contrário, o juro é alto porque a dívida é alta. Quando você endividado vai ao banco, e o banco faz uma análise que você é endividado e não paga a dívida, o juro é alto”, explicou Campos Neto, na ocasião.
E tanto o crescimento da inflação quanto a alta nas despesas com juros (resultado do aumento da taxa Selic, para conter os preços) forçam para cima a dívida pública, aumentando ainda mais a preocupação por parte de investidores — que passam a pedir juros ainda maiores para comprar títulos públicos do Tesouro Nacional.
De acordo com economistas, essa dinâmica ruim tem colocado a economia brasileira em um tipo de “ciclo vicioso”, no qual notícias, indicadores e eventuais declarações de autoridades retroalimentam a percepção dos investidores sobre um cenário negativo na economia.
“Quando os gastos estão maiores, o governo transfere maior poder de compra para a população. Você mantém a economia aquecida. O segundo ponto é a questão da credibilidade do país. Quando começa a parecer que a dívida está numa trajetória é insustentável, crescendo rápido e sem perspectiva de estabilizar, os investidores ficam mais temerosos”, avaliou o economista Guilherme Tinoco, pesquisador associado do FGV IBRE.
Prévia da inflação rompe teto da meta em 2024
Os indicadores da economia são interligados – e a mudança em um gera impacto em todos os outros. Entenda abaixo um exemplo de como pode funcionar esse “ciclo vicioso”:
▶️Um cenário de mais gastos na economia, sem compensação, aumenta o temor dos investidores sobre a manutenção das regras para as contas públicas (arcabouço fiscal) e sobre a sustentabilidade da dívida no médio e longo prazos.
▶️Esse temor pressiona a taxa de câmbio: os investidores retém aplicações em dólar, ou os enviam para mercados considerados “mais seguros” e, com isso, há desvalorização do real (alta da moeda norte-americana).
▶️A combinação de mais gastos públicos, e uma taxa de câmbio mais alta, por sua vez, pressiona a inflação: os produtos importados ficam mais caros em real – incluindo matérias-primas e equipamentos usados no agro e na indústria nacional.
▶️Para tentar domar a inflação, o Banco Central também tem de subir os juros: eles são um instrumento para convencer as pessoas a investir (poupar) mais e gastar menos, o que “esfria” a economia e ajuda a controlar os preços.
▶️Inflação e juros mais altos, no entanto, significam um custo maior quem emitiu o título e precisa remunerar o investidor – o governo, no caso dos títulos públicos. Por isso, retroalimentam um aumento da dívida pública.
▶️Com câmbio, inflação, juros e dívida pública subindo, o cenário econômico se torna instável. O que, obviamente, aumenta ainda mais o temor dos investidores, que pedem juros maiores para comprar títulos públicos.
Peso da inflação na dívida pública
Hoje, quase 30% da dívida em títulos públicos está atrelada a índices de preços, como o IPCA, que mede a inflação do país.
Segundo um cálculo do BC, isso significa que uma alta de 1 ponto nesses índices eleva a dívida pública em cerca de R$ 18 bilhões por ano – 0,15 ponto percentual do PIB.
Alta da Selic e dívida pública
A alta da taxa Selic também impacta diretamente a dívida, já que metade do estoque de títulos públicos é atrelada à taxa básica de juros – hoje em 12,25% ao ano (uma das maiores do mundo em termos reais).
Uma elevação de 1 ponto na taxa Selic aumenta a dívida bruta em R$ 50 bilhões por ano, ou 0,43 ponto percentual do PIB, diz o BC.
Recados do Banco Central
Na última ata do Copom, quando a taxa básica de juros subiu para 12,25% ao ano, em dezembro, o Banco Central, com quatro economistas do Partido dos Trabalhadores na diretoria, avaliou que a conjunção de um “mercado de trabalho robusto, política fiscal expansionista [alta de gastos e vigor nas concessões de crédito amplo segue indicando um suporte ao consumo e consequentemente à demanda agregada”.
O BC voltou a citar a “necessidade de políticas fiscal e monetária [para os juros] “harmoniosas”, ou seja, de promover um equilíbrio nas contas públicas, proporcionando uma perspectiva de estabilização da dívida pública no futuro, evitando a necessidade de uma puxada maior nos juros nos próximos anos.
Para Guilherme Tinoco, economista do FGV IBRE, o governo tem de mostrar ao mercado que as contas públicas vão ser sustentáveis nos próximos anos, apresentando um “pacote crível” com “ajuste estrutural da despesa”, isto é, mudança em regras existentes que pressionam os gastos para cima.
“Tomando medidas mais ou menos em linha com aquele pacote que foi anunciado em novembro e aprovado no Congresso, mas talvez com alguma medida adicional para mostrar o mercado que as metas [fiscais] vão ser cumpridas”, acrescentou ele.
O governo busca zerar o rombo das contas públicas em 2025, mas admite que elas ficarão no vermelho até o fim do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva mesmo com novos aumentos de impostos.
Na ata do Copom, o Banco Central observou, ainda, que a percepção do mercado financeiro sobre o pacote fiscal, considerado aquém do necessário, afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco (curva de juros), as expectativas de inflação e a taxa de câmbio.
Especialista fala sobre o que esperar da economia brasileira para 2025
Pacote de corte de gastos
O pacote proposto pelo governo, e aprovado pelo Legislativo, prevê alterações no ritmo de crescimento do salário mínimo, que será menor, nos gastos com educação, do abono salarial, e de benefícios sociais, entre outros.
De acordo com números do Ministério da Fazenda, o pacote de cortes de gastos deve gerar uma economia de R$ 69,8 bilhões em 2025 e 2026, após as mudanças implementadas pelo Congresso Nacional. Para o mercado financeiro, entretanto, o impacto do pacote será bem menor.
No fim do ano passado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, minimizou as mudanças feitas pelo Legislativo e também acenou ao mercado falando em novas medidas de redução de despesas no decorrer de 2025, sem detalhá-las.
Dívida alta
A dívida do setor público consolidado fechou o mês de novembro em 77,7% do PIB – o equivalente a R$ 9,1 trilhões, segundo informações do Banco Central.
A dívida já subiu seis pontos percentuais desde o começo do governo Lula, em 2023, pois somava 71,7% do PIB no fechamento de 2022.
Se for considerado o critério do Fundo Monetário Internacional (FMI), que contabiliza os títulos públicos que estão na carteira do BC e que é utilizada na comparação internacional, a dívida brasileira terminou novembro desse ano em um patamar maior ainda: em 90,3% do PIB.
Neste nível, a dívida brasileira está abaixo de nações desenvolvidas, próxima de países da União Europeia e acima dos emergentes, da América Latina e do Caribe.
A relação entre dívida e PIB é um indicador relevante para o mercado, interpretado como um sinal da capacidade do país de honrar seus compromissos financeiros de curto, médio e longo prazo. Quanto maior a dívida em relação ao PIB, maior o risco de um calote em momentos de crise.
Além do patamar da dívida, a performance das contas públicas também é avaliada por investidores.
No ano passado, em meio a ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para baixar a taxa de juros da economia, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, explicou no Congresso Nacional como a dívida pública influencia a taxa de juros brasileira.
“Na parte dos juros, a gente não pode confundir causa e efeito. A dívida não é alta porque o juro é alto. É o contrário, o juro é alto porque a dívida é alta. Quando você endividado vai ao banco, e o banco faz uma análise que você é endividado e não paga a dívida, o juro é alto”, explicou Campos Neto, na ocasião.