Dominique Pelicot foi declarado culpado pela Justiça da França por dopar a esposa, Gisèle Pelicot, e recrutar 72 homens para estuprá-la entre os anos de 2011 e 2020. O fim do julgamento de três meses acabou nesta quinta-feira (19) e condenou o francês a 20 anos de prisão, a pena máxima.
“Senhor Pelicot, em relação ao conjunto dos fatos, o declaramos culpado de estupro com agravantes”, declarou o presidente do tribunal de Avignon, Roger Arata.
Os outros 50 homens julgados com Pelicot por estupro com agravantes também foram declarados culpados.
A pena
Na quarta-feira (18), a advogada de Dominique, Béatric Zavarro, ainda esperava que o tribunal “se afastasse” um pouco da pena máxima e considerasse os “traumas” que seu cliente sofreu durante a infância, incluindo um estupro aos 9 anos.
O réu recebeu o veredicto em pé e sem expressar qualquer emoção. Durante o julgamento, ele nunca negou as acusações de ter drogado Gisèle com ansiolíticos para estuprá-la ao lado de homens desconhecidos que ele encontrou pela internet.
Além do principal réu, o tribunal declarou culpados os outros 50 acusados, apesar de cerca de 30 deles terem solicitado a absolvição por acreditarem que foram “manipulados” por Dominique Pelicot.
O grupo recebeu penas que vão de três a 20 anos de prisão. A Promotoria havia solicitado entre 10 e 18 anos de prisão para 49 deles, e quatro anos para o único “processado por “toques” em Gisèle Pelicot.
Os pedidos de penas foram mais rigorosos que a condenação média por estupro na França, que foi de 11,1 anos em 2022, segundo o Ministério da Justiça.
O caso
O escândalo foi descoberto em 2020, quando o acusado foi pego filmando por baixo das saias de mulheres em um centro comercial. Ao apreender o computador e o celular de Pelicot, a polícia descobriu imagens dos estupros cometidos contra a esposa dele.
“Minha mãe me disse: ‘Passei quase o dia inteiro na delegacia. Seu pai me drogou para me estuprar com estranhos’”, contou a filha do casal, Caroline.
“Liguei para meus irmãos. Nos sentimos indefesos. Choramos. Não entendemos o que estava acontecendo. Sofremos uma dor que não desejo a ninguém”, acrescentou, entre lágrimas.
Ao ser detido, Dominique Pelicot manifestou o seu “alívio”, porque “não conseguia parar”. Sua família, porém, questiona sistematicamente suas declarações. Segundo sua filha, “ele só conta parte da verdade quando se vê encurralado”.
As investigações revelam que o crime foi cometido 92 vezes entre julho de 2011 e outubro de 2020, primeiro na região de Paris e depois, em Mazan.
Quem é Dominique Pelicot
Especialistas traçaram o perfil de Dominique Pelicot, de 71 anos. Um psicólogo Bruno Daunizeau definiu as “duas caras” deste “manipulador perverso”.
Avô “carinhoso” e “super legal” de dia, mas estuprador à noite. “De dia, pode ser coerente, e à noite, parecer diferente”, declarou o especialista.
Marianne Douteau, primeira psicóloga a depor como testemunha perante o tribunal nesta segunda-feira, destacou o caráter “raivoso” de Dominique Pelicot, que suscitava “medo”, “mentiras e sigilo”.
O acusado não sofre de “nenhuma patologia ou anomalia mental”, mas sim um “desvio sexual ou parafilia de tipo voyeurístico”, segundo diversos exames psiquiátricos realizados durante a investigação.
Os netos, a quem ele ajudava nos deveres de casa e acompanhava nas atividades esportivas, adoravam o avô. Ele também andava de bicicleta com os vizinhos no icônico Mont Ventoux, perto de sua casa na comuna de Mazan, no sul da França.
Contudo, ninguém suspeitava que à noite, e por vezes durante o dia, ele se tornava um recrutador de desconhecidos para estuprar a própria esposa, a quem havia drogado.