Uma arara-vermelha-grande e uma arara-canindé formam um par raro e despertam a atenção no Buraco das Araras, em Mato Grosso do Sul. Araras de espécies diferentes formam par inusitado no Buraco das Araras
João Marcos Rosa
Entre os psitacídeos, aves conhecidas por formarem pares para a vida toda, a escolha de um parceiro é quase sempre previsível. Quase. No Buraco das Araras, em Mato Grosso do Sul, uma arara-vermelha-grande (Ara chloropterus) e uma arara-canindé (Ara ararauna) desafiaram essa regra ao formarem um casal inusitado.
João Marcos Rosa, fotógrafo de conservação, sempre buscou capturar a beleza e a singularidade das araras do Brasil e da América do Sul. Quando soube da união improvável entre essas espécies, sua vontade de documentar o momento só cresceu.
“Há algum tempo eu vinha observando por postagens e tudo mais a presença desse casal. Eu moro em Minas Gerais, então não estou lá sempre. Eu estava acompanhando e já com uma vontade por essa documentação sistemática que eu faço das araras no Brasil e na América do Sul, eu estava curioso para poder registrar esse momento”, conta o fotógrafo.
Segundo ele, por nunca ter visto uma arara-vermelha-grande com uma arara-canindé juntas, a cena se tornou um almejo do fotógrafo. Por acompanhar essa família de aves há anos, a oportunidade de presenciar e eternizar o momento o deixou ansioso, mas também determinado.
“Eu estava bem ansioso para poder acompanhar isso. Quando eu vi, foi realmente uma grande emoção. Quando houve o sinal de que o casal estava presente ali no local, eu busquei focar bastante neles”, explica João Marcos.
Os psitacídeos são aves que geralmente formam um casal para a vida toda
João Marcos Rosa
A recompensa de registrar uma cena rara como essa foi imensurável para ele, que enxerga em suas imagens uma forma de conectar as pessoas com a natureza e fazer com que elas despertarem o interesse pela conservação.
“Foi uma recompensa muito grande poder documentar uma cena que é muito rara, né? Eu me sinto como uma ponte entre a beleza da natureza e os espectadores que infelizmente ainda não puderam visitar, ver essas cenas, mas a ideia é sempre estimular as pessoas a visitarem, conhecerem e ajudarem nessa tarefa tão árdua da conservação”, diz o documentalista.
O que pode ter levado a formação do casal?
Além de contemplar, o registro também acaba levantando algumas dúvidas sobre o comportamento dessas aves e as razões por trás dessa união improvável. O que teria levado uma arara-canindé a escolher uma arara-vermelha-grande como parceira? Seria a falta de parceiros reprodutivos da mesma espécie ou apenas uma curiosidade natural?
Essas questões, segundo especialistas, exigem um olhar mais atento e estudos aprofundados. Por mais que registros entrem a união de duas espécies diferentes não sejam incomuns, são apenas ocasionais na natureza, explica o ornitólogo Fernando Igor de Godoy.
Segundo ele, entre psitacídeos é ainda mais incomum. O Terra da Gente já mostrou um caso que ocorreu na década de 90, entre uma ararinha-azul e uma maracanã-verdadeira. Mas, e se as araras se reproduzirem?
“Quando espécies como os psitacídeos formam casais duradouros, provavelmente seus descendentes gerarão híbridos inférteis. No caso da arara-canindé com a vermelha-grande, já são conhecidos híbridos, principalmente em cativeiro, com uma plumagem predominantemente laranja”, diz o ornitólogo.
Casal formado por araras de espécies distintas “roubam a cena” no local
João Marcos Rosa
Espécies híbridas tendem a ter desvantagens por não geralmente não conseguirem se reproduzir, sendo menos adaptados às condições ambientais, mesmo existindo casos de espécies que se originaram a partir de hibridismos. Até o presente momento, não se tem notícias de um possível cruzamento entre as duas espécies.
Fernando informa que uma espécie pode escolher um parceiro de uma outra espécie principalmente pela falta de parceiros reprodutivos. Geralmente, espécies diferentes tendem a procurar as que são mais próximas, principalmente comportamental e morfologicamente.
“Geralmente, hibridismos acontecem devido à falta de parceiros reprodutivos de uma das espécies. No caso, pode ser simplesmente que uma, no caso a canindé, seja mais incomum no local naturalmente, não se tratando de impactos ou alterações ambientais”, discorre.
*Texto sob supervisão de Lizzy Martins
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