Ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, afirmou ao “Em Ponto”, que se sente “feliz” com a reação de frigoríficos brasileiros em suspender o fornecimento de carne ao grupo Carrefour no Brasil. Carrefour em Presidente Prudente (SP)
Leonardo Bosisio/g1
O embate entre o Grupo Carrefour e os frigoríficos brasileiros começou na última quarta-feira (20). O CEO da empresa, Alexandre Bompard, divulgou um comunicado em suas redes sociais no qual dizia que a gigante francesa não comercializaria mais carnes provenientes do Mercosul – bloco formado por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai.
“[A empresa] assume hoje o compromisso de não comercializar nenhuma carne proveniente do Mercosul”, escreveu. “Estamos prontos, qualquer que seja o preço e a quantidade de carne que o Mercosul venha a nos oferecer”.
A carta de Bompard foi endereçada a Arnaud Rousseau, presidente do sindicato de agricultores franceses. Eles realizaram diversas manifestações nos últimos dias contra o acordo comercial entre a União Europeia (UE) e o Mercosul.
Um dos receios dos produtores da França é de que o tratado torne os produtos agrícolas sul-americanos mais baratos no território, reduzindo a competitividade das mercadorias europeias.
Porém, o anúncio de Bompard não foi bem-visto pelos frigoríficos brasileiros. Tanto que, um dia após a publicação nas redes sociais, a JBS, Marfrig e Masterboi interromperam o fornecimento de carne bovina ao Carrefour, conforme apurou a Revista Globo Rural.
Entenda nessa reportagem todos os detalhes sobre o imbróglio – que já dura quase uma semana – entre o Carrefour e os frigoríficos.
Como começou imbróglio?
O CEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, publicou em suas redes sociais, um comunicado no qual diz que a gigante francesa do varejo “assume hoje o compromisso de não comercializar nenhuma carne proveniente do Mercosul”, bloco formado por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai.
“No Carrefour, estamos prontos, qualquer que seja o preço e a quantidade de carne que o Mercosul venha a nos oferecer”, disse Bompard. Veja mais abaixo o posicionamento completo.
O CEO do Carrefour, Alexandre Bompard, publicou nesta quarta-feira (20), em suas redes sociais, um comunicado no qual diz que a gigante do varejo “assume hoje o compromisso de não comercializar nenhuma carne proveniente do Mercosul
Reprodução
Porém, um dia depois, em nota ao g1, o escritório do Carrefour na França disse que a medida anunciada vale apenas para as lojas da rede no país e que em todas as demais nações onde o grupo atua, incluindo o Brasil e a Argentina, continuará comercializando carne do Mercosul, bem como em países que utilizam o modelo de franqueado.
À tarde, a rede de supermercados esclareceu ao g1 que quase 100% da carne comprada nas lojas da França é produzida lá — ou seja, a restrição deverá ter impacto pequeno nas exportações dos países do Mercosul.
Para quem foi a publicação do Carrefour?
O comunicado foi publicado nas contas do CEO no Instagram, X e Linkedin, e ocorre em meio a protestos de agricultores franceses contra o acordo da União Europeia com o Mercosul.
A carta de Bompard é endereçada a Arnaud Rousseau, presidente do sindicato francês FNSEA, sigla para Federação Nacional dos Sindicatos de Agricultores.
Vinho despejado, estrume e bloqueios: agricultores franceses protestam
O grupo protestou no mesmo dia em que a carta foi escrita contra o acordo comercial entre a União Europeia (UE). Um dos receios dos produtores é de que o tratado torne os produtos agrícolas sul-americanos mais baratos no território, reduzindo a competitividade das mercadorias europeias.
As manifestações ocorrem em meio à passagem de autoridades da UE pelo Rio de Janeiro, para o encontro do G20, que aconteceu nos dias 18 e 19 de novembro. O acordo, negociado há mais de 20 anos, é apoiado pelos governos da Espanha e Alemanha, mas sofre oposição do presidente da França, Emmanuel Macron.
Os protestos começaram em 18 de novembro, dia do início do encontro do G20, que reúne os líderes das 19 principais economias do mundo, além da União Europeia e União Africana.
Entenda o acordo que gera tensão entre a Europa e o agro brasileiro
O acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia tem o objetivo de reduzir ou zerar as tarifas de importação e exportação entre os dois blocos. Ele não vale apenas para produtos agrícolas, mas este setor tem protagonizado boa parte dos embates.
A negociação começou em 1999 e o termo foi assinado em 2019. Desde então, o texto tem passado por revisões e exigências adicionais, principalmente por parte da União Europeia, devido à pressão imposta pelos por agricultores dos países-membro.
Após 20 anos de negociações, União Europeia e Mercosul fecham acordo comercial
Para ser colocado em prática, o documento precisa ser ratificado pelos parlamentos dos 31 países envolvidos.
O ministro da Agricultura e Pecuária do Brasil, Carlos Fávaro, disse ao Valor Econômico que a expectativa do governo federal é de que o acordo seja anunciado na reunião da cúpula do Mercosul, no próximo dia 6 de dezembro.
Veja abaixo alguns dos pontos do projeto relativos ao agronegócio:
A União Europeia deverá isentar de tarifas 82% das importações agrícolas do Mercosul;
Produtos agrícolas brasileiros, como suco de laranja, frutas, café solúvel, peixes, crustáceos e óleos vegetais terão tarifas eliminadas;
Exportadores brasileiros também terão preferência na venda de carnes bovina, suína e de aves, açúcar, etanol, arroz, ovos e mel;
O acordo possui um mecanismo de salvaguarda que vai permitir a implementação de medidas temporárias caso haja um aumento inesperado e significante de importações que possa causar prejuízos às empresas e produtores agrícolas domésticos;
Alguns produtos ficarão sujeitos a um valor estabelecido por cotas, entre eles a carne bovina, a de aves, a de porco, o arroz e o mel;
Mercosul e UE se comprometem a reduzir entraves de medidas sanitárias e fitossanitárias;
UE e Mercosul se comprometem a implementar efetivamente o Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas, que inclui, entre outros assuntos, combate ao desmatamento e redução da emissão de gases do efeito estufa;
Segundo a UE, não haverá mudanças nos padrões de segurança alimentar e saúde animal do continente – ou seja, o bloco continuará podendo barrar a entrada de produtos que não se enquadrem aos requisitos locais.
Como o movimento do Carrefour repercutiu no Brasil?
Um dia após o anúncio, na quinta-feira (21), a JBS, Marfrig e Masterboi interromperam o fornecimento de carne bovina ao Carrefour, assim como para outras duas lojas do grupo, o Atacadão e o Sam’s Club, conforme apurou a Revista Globo Rural.
“Caminhões da JBS que estavam no percurso para a entrega nas lojas ontem voltaram para trás”, disse uma fonte à reportagem. Questionado pelo g1, a rede afirmou que “não há desabastecimento” em nenhuma de suas lojas.
“É improcedente a alegação de que hoje há desabastecimento de carne nas lojas do Grupo Carrefour Brasil. Tal alegação, veiculada sem identificação de fonte, contribui para desinformação. A comercialização do produto ocorre normalmente nas lojas. Nenhuma loja está desabastecida”, afirmou o Carrefour, em nota.
O ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, de todo modo, afirmou ao “Em Ponto”, que se sente “feliz” com a reação de frigoríficos brasileiros em suspender o fornecimento de carne ao grupo Carrefour no Brasil.
Ministro da Agricultura apoia suspensão de venda de carne para Carrefour
A Federação das Associações Rurais do Mercosul (Farm) também repudiou, na quinta-feira (21), a decisão anunciada por Bompard.
“Os produtores rurais da Farm e suas entidades aqui representadas não aceitarão ataques injustificados e se reservam o direito de reagir de maneira firme, seja por vias econômicas ou institucionais, para proteger a imagem e os interesses do setor agropecuário de seus países”, diz a nota.
“Essa atitude, arbitrária, protecionista e equivocada, prejudica o bloco e ignora os padrões de sustentabilidade, qualidade e conformidade que caracterizam a produção agropecuária nos seus países membros”, escreveu a federação ainda.
A Farm afirmou ainda que o Mercosul é “líder mundial em práticas de sustentabilidade no setor agropecuário” e que a decisão do Carrefour “ataca injustamente a reputação de milhares de produtores rurais comprometidos com a segurança alimentar e a preservação ambiental”.
Mas a França é importante para a exportação brasileira?
Segundo os dados da Associação Brasileira de Indústrias, o peso da União Europeia correspondeu a apenas 3,39% do que foi exportado de carne bovina brasileira pelo mundo. E do total exportado à UE, a França significou apenas 0,66%, informou o Ministério da Agricultura e Pecuária.
O mesmo movimento aconteceu entre janeiro e outubro de 2024. Segundo o Ministério, do total exportado para a União Europeia, que foi 2,79%, a França correspondeu a apenas 0,53%. Dessa forma, o peso francês não é tão impactante quanto em outras regiões na balança de exportação bovina.
Veja abaixo os maiores destinos da carne bovina brasileira em 2023:
China – 52,22%;
Estados Unidos – 6,05%;
Hong Kong – 5,20%;
Chile – 4,39%
União Europeia – 3,39%; e
Egito – 3,11%.
Veja quais são os 10 maiores destinos da carne bovina brasileira em 2023
Atitude semelhante ao Carrefour
Foi o segundo episódio em menos de 1 mês em que executivos de empresas com sede na França falaram sobre restrições que envolvem o agro brasileiro, um dos maiores exportadores do mundo.
Em outubro, o diretor financeiro global da Danone afirmou à Reuters que a gigante de laticínios não comprava mais soja do Brasil. Dias depois, a empresa disse que a informação “não procedia”, mas não explicou a fala.
Post completo do CEO do Carrefour
“Em toda a França, ouvimos o desespero e a indignação dos agricultores diante do projeto de acordo de livre-comércio entre a União Europeia e o Mercosul e o risco de inundação do mercado francês com carne que não atende às suas exigências e normas.
Em resposta a essa preocupação, o Carrefour quer agir em conjunto com o setor agrícola e assume hoje o compromisso de não comercializar nenhuma carne proveniente do Mercosul.
Esperamos inspirar outros atores do setor agroalimentar e impulsionar um movimento mais amplo de solidariedade, além do papel da distribuição, que já lidera a luta em favor da origem francesa da carne que comercializa.
Faço um apelo especial aos atores da restauração fora de casa, que representam mais de 30% do consumo de carne na França – mas onde 60% é importada – para que se unam a esse compromisso.
Somente unidos poderemos garantir aos pecuaristas franceses que não haverá nenhuma possibilidade de contornar essa questão.
No Carrefour, estamos prontos, qualquer que seja o preço e a quantidade de carne que o Mercosul venha a nos oferecer.”