Responsável pelo lugar é suspeito de tortura psicológica, curandeirismo, estelionato e outros crimes financeiros. Moradores da comunidade Osho Rachana praticavam sexo livre como forma de terapia, segundo Polícia Civil. Comunidade Osho Rachana, em Viamão
Reprodução/RBS TV
Uma ex-integrante da comunidade Osho Rachana, em Viamão, na Região Metropolitana de Porto Alegre, relatou práticas de “cura gay”, além de casos de discriminação racial e de gênero por parte do responsável pela seita, investigado por tortura psicológica, curandeirismo, estelionato e outros crimes financeiros. Na quarta-feira (11), a Polícia Civil cumpriu mandados de busca e apreensão na sede do grupo.
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Segundo o relato da ex-moradora de 30 anos, que não quis ser identificada, as práticas aconteciam especialmente durante a pandemia de Covid-19. De acordo com a mulher, pessoas LGBTQIA+ eram incentivadas a “experimentar” relacionamentos heterossexuais.
“Presenciei vários casos de cura gay”, relata a ex-integrante.
“O papo era: a gente está trancado num sítio, a gente não vai sair logo, então ‘não faz sentido tu ficar com mulher, não tem porquê tu ficar com outra mulher e tu tem que ficar com um homem'”, conta.
A ex-moradora explica que essa abordagem era feita sempre levando para o lado terapêutico. Além disso, a mulher relatou que as pessoas no ambiente eram altamente machistas, misóginas e racistas.
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O suspeito e responsável pela seita é Adir Aliatti, de 69 anos. A Polícia Civil afirma que ele comporta-se como um “guru espiritual” da seita, que utiliza diversas práticas de meditação, entre elas, o sexo livre entre os praticantes.
O g1 entrou em contato com a defesa de Aliatti, mas não obteve um retorno até a atualização mais recente desta matéria. No entanto, anteriormente, o advogado do investigado afirmou que “refuta a hipótese levantada pelos denunciantes” e que “já se colocou à disposição das autoridades”. Segundo a defesa, “Aliatti confia na justiça e não se furtará de prestar todos os esclarecimentos devidos nos foros e momentos adequados. Até onde teve conhecimento dos fatos investigados, a materialidade na narrativa não se sustenta por falta de elementos”.
Adir Aliatti, apontado pela polícia como ‘guru espiritual’ de comunidade de Viamão
Reprodução/RBS TV
Suposta violência com cinta
A ex-moradora descreveu um episódio em que o guru, durante uma sessão de um retiro, teria usado uma cinta para bater em uma participante até que ela lembrasse de um suposto episódio de violência sofrida na infância.
“Ele pressionou até ela trazer uma memória, que inclusive, ela me contou depois que era mentira, que ela só falou para ele parar e deixar ela ali, parar de incomodar, parar de humilhar, torturar ela”, diz.
Outras práticas
Ainda de acordo com o relato da ex-integrante da comunidade, Aliatti teria um controle financeiro abusivo, incentivando os moradores a “quebrar” ou “estourar” seus cartões de crédito e repassar os valores obtidos ao financeiro da comunidade, que era controlado diretamente por ele.
Ela ainda fala em exploração, já que, segundo a ex-moradora, os integrantes implementavam jornadas de trabalho intensas em um projeto da comunidade.
“A gente tinha que prestar contas (pra ele)”, conta.
Além disso, a ex-integrante também aponta humilhação pública e comportamento manipulador.
Suspeita de estelionato
Mais de 20 pessoas já foram ouvidas pela polícia. Os depoentes relataram que sofriam tortura psicológica, violência física e patrimonial, além de crimes financeiros, sempre coagidos pelo “guru espiritual”.
O sítio da seita, localizado no interior de Viamão, tem 42 hectares e chegou a abrigar 80 pessoas. Elas dividiam tarefas cotidianas e cultivavam produtos orgânicos, vendidos na região. Além disso, o grupo comercializava cadernos e agendas em Porto Alegre. A renda era revertida para a manutenção da comunidade e das pessoas que viviam lá.
Um homem, que também prefere não ser identificado, morou no local por 16 anos. A ideia de um espaço em meio à natureza em que amigos pudessem partilhar uma vida em comunidade foi o que encantou o antigo integrante do grupo.
“Era a gente ter um lugar onde a gente podia viver com os amigos, onde a gente dividisse os custos das coisas, onde cada um pudesse contribuir com uma parte daquilo ali por igual”, fala.
Porém, depois da pandemia, alguns integrantes perceberam inconsistências nas contas da comunidade. De acordo com a polícia, o “guru espiritual” ficava com o dinheiro obtido através de empréstimos contraídos pelos participantes do grupo.
“Uma administração caótica das finanças proposital, porque, aquela coisa: quanto mais caótica, menos você consegue controlar. Isso levava a gente a achar que sempre estava precisando de mais dinheiro, e como achava que estava precisando de mais dinheiro, as pessoas pediam empréstimo”, conta o ex-morador.
A mulher que afirma ter presenciado as cenas de agressão calcula ter gasto R$ 100 mil em terapias na seita.
“Financeiramente, destruiu os sonhos que eu tinha”, afirma.
Investigações da Polícia Civil apontam que o “guru espiritual” teria desviado cerca de R$ 20 milhões em benefício próprio. Ele teria usado o dinheiro nas próprias empresas, na compra de imóveis, em viagens de luxo e até em apostas online.
“As vítimas começaram a perceber que as contas tinham algum problema financeiro e constataram um prejuízo na casa dos R$ 4 milhões, agora no último ano. Ele teria perdido com dívidas, com apostas online, com viagens”, relata a delegada Jeiselaure de Souza.
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Tortura psicológica
As investigações começaram quando ex-integrantes da seita acionaram o Ministério Público relatando supostos atos violentos cometidos pelo guru do grupo. Segundo a polícia, os seguidores pagavam pacotes de imersão que custavam entre R$ 8 mil e R$ 12 mil, além de mensalidades para viver no local.
As pessoas ouvidas pela polícia relataram ter sofrido tortura psicológica e patrimonial, além de crimes financeiros. A investigação aponta que o guru e outros integrantes do grupo coagiam os participantes, depois de descobrir “coisas muito íntimas dessas pessoas”.
“Ele torturava, ele coagia as vítimas com base nas informações que ele obtinha nas terapias que eram feitas nesses processos de imersão. Se alguém quisesse sair, se alguém percebesse ou dissesse que não tinha dinheiro, ele dizia: ‘é por isso que a tua vida não dá certo’, ‘por isso que a tua relação com o familiar é ruim’, ‘por isso que tu não vai progredir'”, detalha a delegada Jeiselaure de Souza.
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Polícia Civil/Divulgação
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