“Aprendi muito sobre dependência química, uma doença muito grave. E não é só importante para mim, mas para todos nós [detentos] que participamos”. Esse é o relato de um dos participantes do projeto pioneiro que oferece apoio psicológico aos apenados do Presídio Regional de Criciúma.
Lançada em julho deste ano, a ação pretende tratar a dependência química e, assim, quebrar o ciclo de reincidência criminal. O projeto é resultado de uma parceria entre o MPSC (Ministério Público de Santa Catarina), a Unesc (Universidade do Extremo Sul Catarinense) e a unidade prisional.
O grupo de seis detentos se reúne semanalmente com acadêmicos de psicologia. Além de receber suporte, conversam sobre o vício, traçam novos planos e metas de vida, para que, ao deixar o presídio, não retornem ao uso de entorpecentes e à criminalidade.
“Percebemos que havia muita relação dos crimes com o uso de drogas, em especial o crack. Com isso, estávamos ‘chovendo no molhado’, tentando resolver essa questão da forma errada”, conta o idealizador do projeto e promotor de Justiça Jadson Javel Teixeira.
Segundo Teixeira, existe um ciclo vicioso que precisa ser interrompido. “Uma pessoa que cometeu um furto, que é o mais comum, enquanto está presa ela fica bem sem a droga, tem mais saúde, engorda. No entanto, após cumprir a pena e ser solto, volta a ser pego furtando e usando droga. Quando se vê já está com 60 boletins de ocorrência”, alerta Teixeira.
Ao perceber o ciclo vicioso, o promotor de Justiça entendeu que o método utilizado até então não estava trazendo resultados. O projeto é feito com apenados que cumprem penas como furtos e roubos. Eles estão perto de alcançar progressão ao regime aberto e livramento condicional, momento em que voltam a conviver em sociedade.
Projeto pioneiro revela melhoras de comportamento
Na reta final da ação, com sete dos dez encontros previstos já realizados, os resultados são nítidos, conforme apontou o MPSC.
“Eu era uma pessoa meio explosiva, meio ignorante e com as conversas que temos aqui aprendi algumas técnicas para evitar os confrontos e não ter brigas. Teve uma situação em que consegui sair de uma briga, fui para minha cama, fiz o procedimento da respiração que elas [acadêmicas de psicologia] ensinaram e me controlei”, conta um dos detentos.
As estudantes citadas por ele são Danielly Desiderio e Millena de Carvalho, que fazem estágio na unidade e conduzem os encontros. As duas são orientadas por Larissa de Abreu Queiroz, psicóloga, professora e doutora em Saúde Coletiva.
A psicóloga do Presídio Regional, Ana Claudia Schmidt Rabello, explicou que no início o grupo terapêutico foi resistente em participar. “Depois dos primeiros encontros já foram se abrindo mais e hoje já percebemos a entrega deles ao grupo e ao tema”, comenta a profissional.
Entre uma das mudanças mais significativas, Millena relembrou quando um dos participantes do grupo retornou de uma saída temporária sem consumir drogas.
“Cada relato que eles trazem é sempre uma troca muito grande para o grupo, deixando todos muito motivados. No decorrer dos encontros, a gente vê uma mudança bem clara do engajamento deles”, destaca.
Humanização e ressignificação da existência
Além de tratar a dependência química, resgatar a humanidade dos participantes também é o objetivo do projeto.
“O nosso foco é principalmente as pessoas, os seres humanos. Antes de tudo, antes de serem dependentes de drogas e apenados, são pessoas que têm sentimentos, história de vida, família. Eles precisam ressignificar toda uma existência e uma forma de viver para que consigam ter mais qualidade de vida e especialmente mais saúde mental”, explica a professora Larissa.
Projeto entra na grade curricular do curso psicologia da Unesc
O sucesso da ação resultou na expansão do projeto, que a partir do próximo semestre passará a integrar a grade curricular do curso de psicologia para estudantes do sétimo período.
“A Unesc tem sido nossa mão amiga, que tem a mão de obra qualificada para conseguirmos fazer esse projeto. Com esse estágio permanente, finalizamos neste semestre o primeiro grupo e no próximo semestre já iniciamos o próximo. Isso torna nosso projeto atemporal e fico imensamente feliz”, celebra o promotor de Justiça Jadson Javel Teixeira.
Ao fim de cada semestre, os alunos deverão apresentar os resultados, evoluções e observações de cada grupo, aprimorando ainda mais o projeto.