C\u00e1lculo foi baseado no d\u00e9ficit comercial dos Estados Unidos com cada um de seus parceiros comerciais. Assim, pa\u00edses que n\u00e3o podem comprar muito dos EUA receberam taxas maiores. Como as tarifas rec\u00edprocas de Trump foram calculadas?
\nA f\u00f3rmula matem\u00e1tica usada pelo governo dos Estados Unidos para calcular as \u201ctarifas rec\u00edprocas\u201d sobre as importa\u00e7\u00f5es tem gerado cr\u00edticas ao redor do mundo.
\nDe um lado, o presidente americano Donald Trump afirma que os valores foram calculados a partir das taxas que outros pa\u00edses j\u00e1 cobram para importar produtos dos EUA, com um piso de 10% (leia mais abaixo sobre a taxa m\u00ednima).
\n\u201cVamos calcular a taxa combinada de todas as suas tarifas, barreiras n\u00e3o monet\u00e1rias e outras formas de trapa\u00e7a. […] Cobraremos deles aproximadamente metade do que eles t\u00eam cobrado de n\u00f3s\u201d, disse Trump.
\nNo entanto, economistas alegam que, na pr\u00e1tica, a f\u00f3rmula divulgada pela Casa Branca n\u00e3o considera a al\u00edquota cobrada pelos pa\u00edses e, sim, o d\u00e9ficit comercial dos EUA em rela\u00e7\u00e3o a eles (entenda o c\u00e1lculo abaixo).
\n\ud83d\udd0e D\u00e9ficit comercial ocorre quando um pa\u00eds importa mais produtos do que exporta, ou seja, compra mais do que vende, resultando em um saldo financeiro negativo.
\nConsequentemente, a f\u00f3rmula afeta mais fortemente algumas das na\u00e7\u00f5es mais pobres do mundo, que vendem, mas n\u00e3o podem comprar muito dos EUA, resultando em tarifas rec\u00edprocas maiores, destacou a Reuters
\nMadagascar \u00e9 um exemplo. Com um produto interno bruto (PIB) per capita de pouco mais de US$ 500, o pa\u00eds enfrentar\u00e1 uma tarifa de 47% sobre os US$ 733 milh\u00f5es em exporta\u00e7\u00f5es de baunilha, metais e vestu\u00e1rio para os EUA no ano passado.
\n“Presumivelmente ningu\u00e9m est\u00e1 comprando Teslas l\u00e1”, disse John Denton, chefe da C\u00e2mara de Com\u00e9rcio Internacional (ICC), \u00e0 Reuters, uma refer\u00eancia ir\u00f4nica \u00e0 improbabilidade de Madagascar conseguir apaziguar Trump comprando produtos americanos de luxo.
\nNthabiseng Mphou, uma trabalhadora, desempenha suas fun\u00e7\u00f5es na f\u00e1brica da Quantum Apparel nos arredores de Maseru, capital do Lesoto
\nREUTERS\/Siphiwe Sibeko
\nOutro pa\u00eds afetado \u00e9 Lesoto, na \u00c1frica Austral, que Trump descreveu em mar\u00e7o como um pa\u00eds “do qual ningu\u00e9m nunca ouviu falar”. Uma das na\u00e7\u00f5es mais pobres do mundo, tem um PIB de pouco mais de US$ 2 bilh\u00f5es e recebeu a maior taxa da lista de Trump.
\nLesoto tem um grande super\u00e1vit comercial com os Estados Unidos, composto por diamantes e tecidos, incluindo jeans Levi’s. Em 2024, suas exporta\u00e7\u00f5es para os EUA totalizaram US$ 237 milh\u00f5es, representando mais de 10% do seu PIB.
\n“A tarifa rec\u00edproca de 50% introduzida pelo governo dos EUA vai acabar com o setor t\u00eaxtil e de vestu\u00e1rio no Lesoto”, disse Thabo Qhesi, analista econ\u00f4mico independente de Maseru, \u00e0 Reuters.
\nPara Denton, o tarifa\u00e7o de Trump \u201ccorre o risco de prejudicar ainda mais as perspectivas de desenvolvimento de pa\u00edses que j\u00e1 enfrentam uma piora nos termos de troca”.<\/p>\n

A f\u00f3rmula pol\u00eamica
\nF\u00f3rmula utilizada pelos EUA para calcular as chamadas ‘tarifas rec\u00edprocas’
\nUS Trade Representative\/Reprodu\u00e7\u00e3o
\nA f\u00f3rmula divulgada pela Casa Branca calcula as tarifas de forma a zerar os d\u00e9ficits comerciais bilaterais entre os EUA e seus parceiros comerciais. Na teoria, considera uma s\u00e9rie de fatores.
\nAl\u00e9m do n\u00famero de importa\u00e7\u00f5es (mi) e exporta\u00e7\u00f5es (xi) dos EUA para cada pa\u00eds, ela inclui a elasticidade das importa\u00e7\u00f5es com rela\u00e7\u00e3o aos pre\u00e7os de importa\u00e7\u00e3o (\u03b5) e o repasse das tarifas para os pre\u00e7os de importa\u00e7\u00e3o (\u03c6).
\n\u201cN\u00f3s literalmente calculamos barreiras tarif\u00e1rias e n\u00e3o tarif\u00e1rias\u201d, afirmou no X o vice-secret\u00e1rio de imprensa da Casa Branca, Kush Desai, quando questionado sobre a sua metodologia.
\nMas economistas se apressaram em salientar que os termos \u03b5 e \u03c6 se cancelavam de tal forma que a f\u00f3rmula poderia ser reduzida a um simples quociente entre o d\u00e9ficit comercial de bens e as importa\u00e7\u00f5es dos EUA.
\n\u27a1\ufe0f Entenda o c\u00e1lculo abaixo a partir do exemplo da China, que vendeu US$ 438,9 bilh\u00f5es para os EUA em 2024 e comprou US$ 143,5 bilh\u00f5es, segundo dados do US Census Bureau.
\n1. A f\u00f3rmula pega o total de exporta\u00e7\u00f5es dos EUA (xi) e subtrai o total de importa\u00e7\u00f5es (mi), chegando ao d\u00e9ficit comercial.
\nOu seja: 143,5 – 438,9 = -295,4.
\n2. Em seguida, o n\u00famero \u00e9 dividido pelo n\u00famero de importa\u00e7\u00f5es (mi) multiplicado por \u03b5 e \u03c6. Mas esses termos tiveram valores fixos definidos pelo governo: 4 e 0,25, respectivamente, de modo que, multiplicados, equivalem a 1 e n\u00e3o interferem no resultado.
\nNa conta: 295,4 \/ 438,9*1 = 0,67 = 67%, o que Trump alega ser \u201ca tarifa cobrada pela China dos EUA, incluindo manipula\u00e7\u00e3o cambial e barreiras comerciais\u201d.
\n3. Ent\u00e3o, para definir a \u201ctarifa rec\u00edproca\u201d, que ser\u00e1 cobrada pelos EUA, esse valor foi dividido pela metade, um \u201cdesconto\u201d aplicado porque os americanos s\u00e3o \u201cmuito gentis\u201d, segundo Trump.
\nResultado: 67% \/ 2 = 34%.
\nCom o c\u00e1lculo feito dessa forma, quanto maior o d\u00e9ficit comercial dos EUA com um determinado pa\u00eds, maior a tarifa, explica o economista Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp.
\n\u201cTrump falou como se a China cobrasse 67% de tarifas dos EUA, o que n\u00e3o \u00e9 verdade. Na tabela, havia uma informa\u00e7\u00e3o que dizia que o c\u00e1lculo considerava manipula\u00e7\u00e3o cambial e barreiras n\u00e3o tarif\u00e1rias, mas o c\u00e1lculo mostra que os valores s\u00e3o determinados em fun\u00e7\u00e3o do d\u00e9ficit comercial dos EUA com esses pa\u00edses\u201d, resume o professor.
\nPost no X ironiza f\u00f3rmula utilizada por Trump para calcular ‘tarifas rec\u00edprocas’ dos EUA
\nX\/Reprodu\u00e7\u00e3o
\nEnt\u00e3o, as tarifas podem ser chamadas de \u2018rec\u00edprocas\u2019?
\nPara a Uni\u00e3o Europeia, a f\u00f3rmula matem\u00e1tica produziu uma tarifa punitiva de 20% \u2014 quatro vezes os 5% que a Organiza\u00e7\u00e3o Mundial do Com\u00e9rcio (OMC) calcula como a taxa m\u00e9dia da UE.
\n“Ent\u00e3o, pelo menos para n\u00f3s, \u00e9 uma imprecis\u00e3o colossal”, disse Stefano Berni, gerente-geral do cons\u00f3rcio que representa os fabricantes do queijo especial Grana Padano na It\u00e1lia.
\n“Hoje, custa tr\u00eas vezes mais para n\u00f3s entrar nos EUA do que para os queijos americanos entrarem em nosso mercado”, afirmou em um comunicado.
\n“Realmente n\u00e3o h\u00e1 metodologia a\u00ed”, disse \u00e0 Reuters Mary Lovely, membro s\u00eanior do Instituto Peterson de Economia Internacional.
\n“\u00c9 como descobrir que voc\u00ea tem c\u00e2ncer e descobrir que o medicamento \u00e9 baseado no seu peso dividido pela sua idade. A palavra ‘rec\u00edproco’ \u00e9 profundamente enganosa.”
\nPara Pedro Rossi, da Unicamp, o governo americano manipulou as estat\u00edsticas \u201cpara vender essas tarifas como rec\u00edprocas, quando na verdade s\u00e3o unilaterais\u201d.
\nEle disse que, para a reciprocidade fazer sentido, o c\u00e1lculo deveria observar as tarifas cobradas de cada setor, sem rela\u00e7\u00e3o com o d\u00e9ficit ou super\u00e1vit comercial. E cobrar as taxas por setor, n\u00e3o por pa\u00eds.
\nAl\u00e9m disso, Rossi explicou que \u201c\u00e9 natural que pa\u00edses tenham d\u00e9ficit comercial com alguns pa\u00edses e super\u00e1vit com outros, de acordo com a complementaridade produtiva e comercial\u201d.
\n\u201cPor exemplo, um pa\u00eds pode exportar autom\u00f3veis para um parceiro com o qual tem super\u00e1vit e importar pe\u00e7as de outro com o qual ele tem d\u00e9ficit. Zerar o resultado comercial com ambos os pa\u00edses desmonta as cadeias produtivas e cria problemas econ\u00f4micos.\u201d
\nTaxa m\u00ednima de 10%
\nO c\u00e1lculo divulgado pela Casa Branca n\u00e3o foi utilizado para todos os pa\u00edses alvo das tarifas de Trump. O governo americano estabeleceu uma taxa m\u00ednima de 10% mesmo para na\u00e7\u00f5es com as quais os EUA n\u00e3o t\u00eam d\u00e9ficit comercial.
\n\u00c9 o caso do Brasil. De acordo com o US Census Bureau, os americanos venderam US$ 49,6 bilh\u00f5es em bens para os brasileiros em 2024, e compraram US$ 42,3 bilh\u00f5es.
\nAssim, os EUA n\u00e3o t\u00eam d\u00e9ficit e, sim, um super\u00e1vit comercial de US$ 7,3 bilh\u00f5es com o Brasil. Por isso, o pa\u00eds ser\u00e1 taxado com o percentual m\u00ednimo, de 10%.
\nQuem tamb\u00e9m acabou com uma taxa de importa\u00e7\u00e3o de 10% foi o territ\u00f3rio vulc\u00e2nico das Ilhas Heard e McDonald, que ficam entre a Ant\u00e1rtica e Madagascar, no Oceano Ant\u00e1rtico.
\nAs ilhas n\u00e3o possuem habitantes e s\u00e3o povoadas por pinguins e focas. A medida gerou uma enxurrada de memes nas redes sociais.
\nMemes criados ap\u00f3s Trump anunciar tarifas contras territ\u00f3rio de ilhas que s\u00f3 tem pinguins
\nReprodu\u00e7\u00e3o
\n*Com informa\u00e7\u00f5es da ag\u00eancia de not\u00edcias Reuters.<\/p><\/div>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"