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Dependência química e família: quais caminhos pais, filhos e parentes podem seguir para enfrentar a doença


Segundo especialistas ouvidos pelo g1, famílias não podem demorar para pedir ajuda de especialistas quando identificarem a dependência química. Dependência química e família: quais caminhos seguir para enfrentar a doença
O impacto da dependência química vai além do usuário de drogas. Não raramente, ela resulta em uma montanha-russa de emoções, desafios e estresses que afetam todos os membros da família. Sendo assim, é comum a família adoecer junto com o adicto.
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O psicólogo e terapeuta familiar especializado em dependência química, Raphael Mestres, explica que famílias com dependentes químicos enfrentam desafios em comum, como o medo e a manipulação por parte do usuário de drogas.
Na avaliação do psicólogo, para enfrentar o problema, uma das primeiras atitudes que devem ser tomadas é procurar ajuda tão logo a dependência seja identificada.
Todos os sentimentos entorno da dependência química são sentidos na pele da curitibana e analista de tecnologia da informação Érica Fidelis. Os dois irmãos dela, de 33 e 24 anos, vivem com a doença.
Érica Fidelis, analista de tecnologia da informação
Giuliano Gomes/PR Press
Ela conta que o irmão foi o primeiro a enfrentar o problema, que teve como estopim a morte do avô. Veja o depoimento dela no vídeo acima.
“Nós não temos pai biológico, todos os irmãos foram criados pelo meu avô, que faleceu em 2019. Nessa época, os dois já usavam drogas, mas não era de forma clara para que a família soubesse, pois meu avô era policial civil, rígido e autoritário. Eles tinham medo dele, mas após o falecimento dele, começou a nossa dor de cabeça”, conta.
Segundo Érica, o irmão fez uso de drogas ilícitas por quatro anos. Para ela, o período em que ele ficou imerso nas drogas foi marcado, por exemplo, pela preocupação.
Érica Fidelis
Giuliano Gomes/PR Press
Ele chegou, segundo ela, a ser esfaqueado e ameaçado de morte por traficantes.
O envolvimento dos irmãos com traficantes e ameaças constantes representavam um risco à segurança da família, por isso, eles preferiram se mudar.
No caso do irmão, a luz no fim do túnel foi a internação compulsória, aconselhada em casos específicos e como última alternativa.
Neste processo, a família contou com o apoio do Ministério Público do Paraná (MP-PR). Por intermédio do órgão, durante três meses, o Estado custeou o tratamento. Depois, ela conta que o irmão foi transferido para uma clínica particular.
Segundo a analista, ele está há nove meses internado, em tratamento.
“Entendi que isso, sem dúvidas, se trata de um problema de saúde mental. Então, não adianta bater, brigar, mandar embora de casa, porque nem eles sabem o que tão fazendo”, pontuou.
Atualmente, Érica e a família estão recorrendo novamente ao MP, agora, para resgatar a irmã. Enquanto não conseguem viabilizar o tratamento dela, Érica cuida dos três sobrinhos.
A criança mais velha, de oito anos, sofre com a situação e precisa de acompanhamento psicológico para lidar com a ansiedade resultante da ausência da mãe.
“Quando ela vem para casa é só alegria. A gente tenta fazer com que ela se sinta o mais confortável possível com as crianças. Ela cuida de todos sem diferenças entre um e outro, mas prefere voltar para a rua.”
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Família é essencial para o tratamento, diz psicólogo
De acordo com o psicólogo Raphael Mestres, a família é o elemento mais estruturante de um tratamento. E, para enfrentar o problema, a agilidade é fundamental.
A experiência do psicólogo mostra que, em geral, as famílias descobrem a dependência química três anos após o doente começar a usar drogas e levam mais três anos para buscarem ajuda especializada. Assista ao vídeo abaixo:
Famílias com pessoas dependentes em drogas precisam procurar ajuda ao identificar problema
“Normalmente chegam aqui depois de seis anos com o problema se desenvolvendo. Tem raríssimas exceções que a família chega aqui quando descobriu já e tal, e aí fica muito mais fácil de lidar com com a situação do que quando tem problema mais instalado”, explica.
Raphael destaca que a vida do dependente gira em torno da droga, ou seja, ele abre mão de prioridades e responsabilidades.
Com isso, a vida dos familiares começa a girar em torno de dependente, causando prejuízos muito parecidos com os quais a pessoa com dependência convive.
Por isso, conforme o psicólogo, é comum a família adoecer junto com o dependente. Além disso, ao passo que a doença se grava, se estabelecem padrões de relacionamento na família que nutrem o problema ao invés de combatê-lo.
“Os pais começam a ter problema no trabalho, a produtividade cai, o casamento já não tem mais atenção, a vida social vai ficando restrita.”
Famílias com usuários de drogas devem procurar ajuda tão logo percebam a dependência, alerta psicólogo
V.ivash/Freepik
Tratamento familiar também é um caminho
Segundo Raphael, na terapia familiar são abordados temas que auxiliam a família onde, na maioria dos casos, não há mais uma hierarquia no lar. Ele cita pais e filhos como exemplo.
“Na doença, a família se adapta ao dependente, né? E no tratamento, o dependente se adapta à família. Isso depende dos pais tomarem as regras”, cita.
O tratamento familiar também é aconselhado para combater a manipulação, arma que dependentes químicos utilizam para driblar eventuais tratamentos.
“Ele vai dividindo os pais, ele fala com um, depois fala com o outro. Quando um dá limite, vai falar com o outro que libera”, completou.
A terapia busca trazer a união para que o problema não se agrave. Busca também, segundo Raphael, trazer a autoridade, o vínculo e o afeto.
De acordo com o psicólogo, quando não há participação familiar, os dependentes sofrem porque a família continua infantilizando e controlando a vida deles, sem ajudar efetivamente.
“Ela [a família] está adaptada ainda ao padrão de dependência química e normalmente essa é uma dinâmica que dificulta o processo dele de se manter limpo, pois vem raiva, vem revolta, não reconhecem [o esforço], daí vai pra recaída”, completou.
Antes de tratar, família precisa olhar as próprias atitudes
Cleuza Canan, psicóloga e especialista em dependentes químicos, explica que a família precisa ter um olhar sobre os próprios hábitos que podem assumir maior proporção quando há um dependente químico em casa.
“Muitas vezes essa porta é o álcool, né? A bebida alcoólica está presente nas famílias, está presente no dia a dia, no cotidiano. Nós vivemos numa sociedade que não entende álcool com droga. Isso faz com que as famílias tenham o álcool presente em todos os seus momentos, nos seus rituais, em festas infantis, Natal, Ano Novo…”
Famílias de pessoas com dependência química devem evitar julgamento, diz psicóloga
Cleuza explica que quando o dependente começa a usar drogas, gradativamente ele tem perdas cognitivas, parando de diferenciar o que é certo e errado, ou o que é bom e ruim. Perde, também, a capacidade crítica, a consciência, e o poder de julgamento.
Então, se a família tenta conversar com essa pessoa, que está anestesiada pelo efeito da droga, ela não tem compreensão e aceitação, explica Cleuza.
A psicóloga também destaca que, mesmo que um dependente químico se comprometa a parar de usar drogas, provavelmente continuará, justamente por perder a capacidade de discernimento.
Ao procurar ajuda, família continua no tratamento
Cleuza sugere que, ao descobrir que há este problema com alguém próximo, o primeiro passo é buscar um profissional especialista no assunto, independentemente da vontade do familiar.
Em seguida, o profissional direciona o tratamento adequado, de acordo com a história e características do dependente químico. Neste processo, ferramentas como chantagem são desaconselhadas.
A psicóloga detalha que, a partir do histórico do caso, o profissional responsável pelo tratamento vai definir quem será o responsável por continuar o acompanhamento, ou seja, quem é a pessoa mais saudável, ainda não afetada pela doença, que pode auxiliar no processo.
Caps Cajuru, em Curitiba
Arquivo RPC
SUS: Como pedir ajuda no sistema público?
O promotor de justiça Diogo Russo, do Ministério Público do Paraná (MP-PR), afirma que o Sistema Único de Saúde (SUS) também é um caminho para famílias pedirem ajuda e a porta de entrada é a Unidade Básica de Saúde (UBS).
Ele explica que, pela UBS, famílias podem ingressar na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), responsável por acolher pessoas com sofrimento mental e com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas.
Na Rede os profissionais acompanham qual o nível de comprometimento do solicitante e a necessidade de acompanhamento da família. Depois, o paciente pode ser encaminhado para os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que direcionarão o tratamento de saúde adequado.
Grupo de ajuda ‘Narcóticos Anônimos’
Outro caminho para quem busca ajuda é o programa Narcóticos Anônimos (NA), grupo de mútua ajuda que atua em todo o país, sem fins lucrativos, onde adictos em recuperação se reúnem regularmente.
Nas reuniões, os participantes trocam experiências com o objetivo de se ajudarem a manter o tratamento e a sobriedade.
Como buscar:
Por meio do site do NA o interessado pode buscar por reuniões e escolher o local mais próximo de onde está, fornecer as informações de cidade ou bairro. Em seguida, o site mostra os locais onde os grupos se reúnem.
As reuniões também podem ser feitas de forma on-line, segundo o NA. Clique aqui para saber mais.
O contato também pode ser feito por meio dos telefones, por ligação ou WhatsApp:
Curitiba: (41) 99777-0209
Cascavel: (45) 99932-2324
Londrina: (43) 99997-2872
Maringá: (44) 99805-1605
Quando é indicada a internação?
A internação é uma possibilidade de tratamento, quando um especialista entender necessário. Por isso, a família precisa estar preparada para utilizar o recurso.
Como forma de comparação, Cleuza Canan, psicóloga e especialista em dependentes químicos, explica que a internação tem a mesma lógica que uma quimioterapia para o câncer, por exemplo. É uma intervenção em uma crise para proteger a vida.
Ainda conforme a especialista, a família não pode cair na armadilha de acreditar que, se ele for internado, vai sentir raiva, fugir de casa ou atentar contra a própria vida, por exemplo.
“Não falar: ‘Se você não parar, eu te interno’. A internação não vem como uma ideia de tratamento, acaba vindo como uma ideia de castigo e punição”, falou.
De acordo com o promotor Russo, outra possibilidade é a internação compulsória. Ele explica que o recurso só é utilizado em último caso, quando o especialista identificar que a pessoa não consegue responder pelos próprios atos, ou quando a conduta dela pode afetar terceiros, sejam familiares ou não.
“A internação compulsória depende daquilo que a gente chama de relatório médico circunstanciado, ou seja, é o médico que tem que apontar que ali que um caso de internação e que foram esgotados todos os meios extra hospitalares disponíveis ali naquele caso”, disse. Veja mais detalhes no vídeo abaixo:
Famílias do Paraná com dependentes químicos podem procurar ajuda com o Ministério Público
Preparação da família para a alta pós tratamento
A psicóloga Cleuza Canan explica que, durante a internação do dependente, as famílias serão preparadas para saber como agir quando o familiar deixar a clínica.
Ela sugere que, com a família preparada, os atritos podem ser menores. Durante o processo de preparação, os especialistas lidam com coisas como definir regras e pensar em novas normas para a casa, por exemplo.
Nesse treinamento, a família também vai aprender a conversar com o dependente de uma forma mais positiva.
“Isso diminui muito a ansiedade, diminui a culpa, a vergonha, o medo, porque a família começa a entender que, como toda doença, ela tem processo de recuperação, que vai caminhar junto com o seu trabalho familiar também”, explica Cleuza.
Como o Ministério Público pode ajudar?
Uma das principais funções do Ministério Público é garantir os direitos individuais do cidadão. Então, de acordo com o promotor de justiça Diogo Russo, o MP atua no tema de forma transversal, ou seja, abrangendo áreas como direito à saúde e à educação, por exemplo.
O promotor ressalta a importância também do trabalho do MP com as famílias.
“Num processo em que uma mãe está fazendo o uso abusivo de substância psicoativa e ela não consegue mais gerenciar a vida dela e dos filhos dela, o Ministério Público entra com ação de destituição do poder familiar, porque nesse aspecto, pode entrar com a ação pra proteger essas crianças”, exemplifica.
Por outro lado, o órgão garante ações e estratégias para dar o melhor tratamento no sistema de saúde ao usuário e também aos familiares, com acompanhamento psicológico e psiquiátrico.
O promotor cita também que, em casos onde o dependente químico está envolvido com crimes, o MP tem o papel de reinserir ele ao núcleo familiar e à comunidade.
“Quando a gente trata de um tema que é multidisciplinar, que é transversal, a atuação tanto do Ministério Público, como os demais atores ali do do sistema de justiça, ela também é transversal”, fala.
Para pedir ajuda ao MP do Paraná, interessados podem acessar site, no ícone “Promotoria de Justiça”. Em Curitiba, famílias podem ligar no telefone (41) 3250-4200.
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